quinta-feira, 29 de maio de 2008

O saque do litoral alentejano

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O processo de infracção aberto pela Comissão Europeia contra Portugal por graves deficiências nas avaliações de impacte ambiental dos licenciamentos de três grandes projectos turístico-imobiliários, nos concelhos de Alcácer do Sal e Grândola, trouxe de novo para o debate a perversidade, para o ordenamento do território e o de-senvolvimento sustentável, dos chamados projectos de potencial interesse nacional (PIN+).

As autorizações concedidas para estes empreendimentos em pleno litoral alentejano - Costa Terra, Herdade do Pinheirinho e Herdade da Comporta - correram por conta dos procedimentos acelerados previstos no diploma que cria os PIN+. Sob o argumento de que é necessário desburocratizar os mecanismos de decisão, o Governo, inicialmente através de uma mera resolução do Conselho de Ministros e, posteriormente, conferindo-lhe a gravidade de decreto-lei, criou um conjunto de excepções que promovem, aceleradamente, a especulação imobiliária e a ocupação de áreas ambientalmente sensíveis que, de outra forma, estariam protegidas pelos devidos instrumentos de planeamento e ordenamento do território.

Repare-se que, apenas neste exemplo da costa alentejana, os complexos licenciados abrangem cerca de 1200 hectares, seis campos de golfe, 21 aldeamentos turísticos, 660 moradias e 21 hotéis, representando um total de mais de 16 mil camas e vários equipamentos de apoio ao turismo. Tudo isto num território litoral identificado como Sítio de Importância Comunitária (Comporta/Galé), classificado como Zona Especial de Conservação, integrada na Rede Natura 2000, e envolvendo espécies e habitats considerados de protecção prioritários.

Precisamente porque são áreas a preservar, impedidas, por princípio, de serem objecto de construção, os terrenos são adquiridos a custos baixíssimos por grupos financeiros que rapidamente os transformam em PIN gerando mais-valias especulativas absolutamente brutais e imorais.

Esta escandalosa política de gestão do território é responsável pela devastação de zonas de elevada sensibilidade ambiental e de grande potencial paisagístico. São de tal modo indecorosos os licenciamentos permitidos pelos PIN, que a própria Comissão Europeia se sente obrigada a chamar à atenção do Governo português para as próprias avaliações de impacto ambiental, claramente desadequadas, "uma vez que falham em levar em conta os impactos negativos em habitats e espécies prioritários no Sítio de Importância Comunitária, e não avaliam os impactos cumulativos com outros projectos previstos para o mesmo sítio, nem analisam adequadamente soluções alternativas", conforme refere a Comissão.

Perante o descrédito lançado pela Comissão Europeia sobre os procedimentos aceites pelas autoridades nacionais para viabilizar os PIN, seria natural e de bom senso que o Governo suspendesse de imediato os licenciamentos destes projectos ditos prioritários e reavaliasse a legislação que os promove, em nome, obviamente, do interesse nacional.

Jornal de Notícias, 28 Maio 2008
Pedro Soares, Coordenador Nacional Autárquico do BE


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